29.2.20

Por onde for


A graça se revela em harmonia
Alvorecendo a beleza em cores
Quero levar você em todo dia
A vida inteira na estação das flores.

Descanso o teu olhar no meu sem dizer adeus
Que o tempo põe a mesa pra nós dois...

Lorena Chaves

24.2.20

Uma história real sobre anjo


Descobri que tenho um anjo da guarda. Nas horas de aperto, dizem que é só chamar por ele.

Uma vez, na saída de um shopping, dois zonzos, meu primo e eu chamamos a atenção de meio planeta; ai que vergonha! Quase fomos atropelados. Sorte que eu o puxei pela camisa. O som da freada do carro foi horrível! Até hoje ecoa em meus ouvidos. Depois daquela façanha, com um pouquinho mais de treino, poderíamos facilmente seguir a profissão de dublê. Mas fiquei pensando... será que foi o anjo? Será que foi ele quem soprou no meu ouvido: “segura aí esse distraído ou ele vai quebrar umas costelas!”?

Quantas vezes, bem na hora de sair de casa, perdi minha carteira ou as chaves e, por isso, ficava um tempão procurando os objetos desaparecidos. Será que era o anjo me atrasando para evitar algum acidente ou assalto? Anjo faz isso? Bagunça a vida da gente pra nos livrar de apuros? Ou são simplesmente minhas trapalhadas? Dizem que se a gente não ligar pra ele, o coitado do anjo fica sem graça, se sente esquecido, pensando que não é importante e, daí, acaba dando no pé.

Um dia, quando ia pra escola, aconteceu algo também bastante esquisito, desta vez, esquisitíssimo. Era uma manhã dessas normais, após uma noite de muita chuva, em que os semáforos, alucinados, ignoravam a pressa dos carros e dos pedestres.

Quando percebi que o sinal de trânsito não estava funcionando direito, fiquei nervoso. Foi como se as lembranças do quase-atropelamento em frente ao shopping brotassem de novo na minha cabeça.

Depois de algum tempo, consegui atravessar uma das faixas e fiquei no canteiro central, esperando uma oportunidade pra me livrar daquela fria. O vento dos automóveis e o barulho dos motores me davam arrepios.

Alguns malucos aventureiros se arriscavam, tirando lasquinhas nos veículos, e os veículos tirando lasquinhas neles. Meu coração pulsava de medo, querendo fugir pela boca. Ao meu lado, um desconhecido puxou conversa e alertou: “Cuidado, garoto, não atravesse agora!”. Olhei pra ele e pensei: “quem é esse sujeito, meu Deus?”. Ele continuou: “Espere só um pouquinho. Logo a gente consegue atravessar com segurança. Eu morro de medo. Você não?”. Nem respondi, porque fiquei surpreso com aquele estranho falando comigo.

Bem, e foi assim que, após alguns segundos, cruzamos a via juntos. Fomos em silêncio pela calçada. Àquela altura do campeonato, já havia me acalmado. Até me esqueci do medo e troquei duas ou três palavras com o tal cara. Meu ônibus surgiu e me apressei pra não perdê-lo. Antes, resolvi me despedir do rapaz que atravessou comigo a avenida; afinal, ele tinha sido simpático.

O ponto estava lotado e não consegui mais avistá-lo. Entrei no lotação, passei pela roleta com o olhar fixo na multidão lá fora. O homem tinha desaparecido. Mas, como? Pra onde? Não havia outro ônibus no qual ele pudesse ter se metido. Não havia outra rua pela qual ele pudesse ter seguido.

O coletivo arrancou devagarinho e meu pensamento de novo se perdeu de espanto. Será que era ele, meu anjo da guarda dando sopa? De novo?

Pedro Antônio de Oliveira

Curiosidade: Dizem que meu anjo da guarda se chama Haiaiel. É fácil descobrir. Existem muitos sites por aí que revelam quem é seu anjo da guarda, bastando informar a data de nascimento. O anjo Haiaiel confunde o mal e ajuda todos que querem se livrar de pessoas que praticam a maldade. Incentiva a ter garra e perseverança na luta em favor da paz e para alcançar os objetivos na vida. O influenciado por esse anjo será livre de perversidade ou negatividade. Ele trabalha para Deus com inteligência e coragem para superar a opressão e a servidão. Terá a proteção divina para tomar a decisão certa. Libertará os fracos e oprimidos superando as adversidades. Protege e leva à vitória, com braveza e coragem.

21.2.20

À sombra de um jatobá


Raios de sol na varanda
Verde cobrindo o jardim
Poder sentir a vida espreguiçar.

Com o cheiro da madrugada
Dama-da-noite, jasmim
Olhar no céu estrelas pra contar.

Ter meus amigos comigo
Quem amo me amando, sim
Longe do amor de quem nos finge amar.

Ver na manhã de um domingo
Meu filho sorrir pra mim
Depois dormir à sombra de um jatobá.

Poucas coisas valem a pena
O importante é ter prazer
Longe de mim a inveja e a maldade escondidas na vida
Hoje estamos nós em cena e não há tempo a perder
Pois tudo acaba mesmo sempre em despedida.

Toquinho

16.2.20

Telhados de Paris


Venta, ali se vê
Aonde o arvoredo inventa um balé
Enquanto invento aqui pra mim
Um silêncio sem fim
Deixando a rima assim
Sem mágoas, sem nada
Só uma janela em cruz
E uma paisagem tão comum
Telhados de Paris
Em casas velhas, mudas
Em blocos que o engano fez aqui
Mas tem no outono uma luz
Que acaricia essa dureza cor de giz
Que mora ao lado, mas parece outro país
Que me estranha, mas não sabe se é feliz
E não entende quando eu grito
Eu tenho os olhos doidos, doidos, doidos, doidos, já vi
Meus olhos doidos, doidos, doidos, são doidos por ti
O tempo se foi
Há tempos que eu já desisti
Dos planos daquele assalto
De versos retos, corretos
E o resto de paixão, reguei
Vai servir pra nós
E o doce da loucura é teu, é meu
Pra usar a sós
Eu tenho os olhos doidos, doidos, doidos, já vi
Meus olhos doidos, doidos, doidos, são doidos por ti
Eu tenho os olhos doidos, doidos, doidos, já vi
Meus olhos doidos, doidos, doidos, são doidos por ti
Venta...
Venta...
Venta...

Zélia Duncan

10.2.20

Só você vai entender


Eu gosto de coisas galácticas. 
De estrelas, cometas, planetas e luas. 
Amo também naves imperiais que me levam de futuro a futuro. 
E por lá, não há motivos para temer.
Até nem me lembro direito das coisas tristes que já vi pela TV. 
Eu converso em várias línguas com gente de canto a canto do infinito. 
Ah... viajar é tão bonito. 

Pedro Antônio de Oliveira

Uma abraço de coragem


E dizem que um anjo trazendo um sol nas palavras ergueu o menino.
Foi numa manhã de domingo, aparentemente comum.
Com seus poderes de anjo, falou entre um sonho e outro, no restinho de sono, coisas tão bonitas que pareciam água matando a sede. O menino achava que já tinha perdido toda aquela ilusão que o acompanhara desde os primeiros passos. O menino achava que já tinha perdido. Mas ele se esqueceu do anjo que nascera antes dele e que, lá das altas nuvens, tinha feito uma promessa: jamais abandonar seu protegido. O anjo, antes de mais nada, era seu melhor amigo.

Pedro Antônio de Oliveira

1.2.20

O crime não compensa



Nunca suportei ver alguém ao meu lado mendigando cola. Esse meu coração de manteiga de garrafa ainda iria me botar em maus lençóis, era só questão de tempo. Bastava começar a prova e eu podia dar adeus ao sossego. A todo momento, chegavam papeizinhos e cochichos suplicando as respostas das questões. Todos com cara de cachorro que caiu da mudança e esfolou o focinho. Alguns, mais desesperados, só faltavam derramar lágrimas.

E foi assim que um belo dia a professora de Português descobriu que minha prova e a de uma protegida, leia-se: “coleguinha sanguessuga”, estavam identicamente iguais. Oh, céus! Que coincidência! Fiz cena de espanto misturada à de pobre coitado, vítima em último grau daqueles aproveitadores, embora estivesse tremendo de verdade.

A enfurecida mestra nos deu um minuto e meio para uma exibição de nossas técnicas de telepatia. Só assim, para eu me livrar da acusação de cola, já que nossas provas estavam perfeitamente cara de uma, focinho da outra, até na posição das vírgulas.

Eu poderia ter dito que éramos irmãos, digamos, quase siameses, e que por isso fazíamos tudo quase sempre igual, de tanta afinidade e frequência positiva de energias, mas não ia colar.

Fiquei triste porque todo o meu passado de glórias escorria pelo ralo. O que adiantou tanto esforço nos saraus de poesia, na peça de teatro e nas apresentações de trabalho, se havia me tornado oficialmente, em poucos minutos, um criminoso comum, um legítimo colador.

Ela ameaçou:

_ Então, por enquanto, os dois estão com zero. Se não aparecer o culpado, os dois fazem de novo a prova, OK?

OK nada. Estava num mato sem cachorro. Não tinha coragem de entregar a M. (prefiro assim, não citar o nome dela). Afinal, ela era minha amiga. E, no fundo, no fundo, eu também era culpado, porque poderia simplesmente ter me negado a passar a cola. Por estar sempre tão disposto a ajudar todo mundo é que acabei mantendo essa rotina criminosa em sala de aula. Por milésimos de segundo, fiquei com um pouco de raiva dela por ter me colocado naquela fria. Eu não precisava passar por aquilo.

_ E aí? Vão permanecer calados?

Meu coração disparou. Não estava acostumado a ouvir a professora falando naquele tom. Arrisquei e quebrei o silêncio:

_ Professora, eu não colei de ninguém, disse pausadamente, em tom forte, mistura de medo e raiva.

Minha colega, pivô de todo aquele tribunal de justiça, cavou minha liberdade:

_ Fui eu, professora. Eu errei. Pode me aplicar de novo a prova.

Ufa! Respirei aliviado. Que ironia! Uma cola me fez aprender a lição.

Pedro Antônio de Oliveira