29.1.20

O cinza das rosas


Cuidei delas com carinho. Toda tarde, namorava os botões dourados de fim do dia, à espera de uma explosão de pétalas e cores. O vento sacudia o caule e eu morria de medo de que elas se desmanchassem de repente. Podei muitas vezes seus excessos. Molhei a terra seca em meados de agosto, tempo em que a chuva se esquece da gente, deixando tudo nublado de poeira.

Mas foram aqueles meninos, os piores vilões da rua, sórdidos e invencíveis, que puseram fim ao meu poema maior. A rechonchuda invadiu o jardim num chute certeiro, num arremesso feroz, atingindo em cheio minhas bailarinas.

Tudo aconteceu bem diante dos meus olhos. As flores, amassadas, agonizaram no chão. E, por cima, lá estava ela, aquela assassina horrorosa. Nem foi preciso chamar os agressores. Três caras lavadas apontaram nas frestas do muro. Um deles perguntou se uma bola havia caído por ali.

Apenas abri o portão e os deixei entrar. Sem dizer uma só palavra, apontei o estrago, cobrando, com o silêncio e o choro contido, explicações para tanta maldade. Eu estava tão triste que os garotos notaram meu jeito.

O mais jovem retirou a bola de cima das roseiras amarrotadas. Sobrou apenas um botão. A bola não se machucou. Os espinhos não se defenderam, pois ainda não tinham aprendido a guerrear.

Os meninos foram embora sem dizer nada. Nunca me esqueci daquele dia em que minha paz foi ameaçada.

Pedro Antônio de Oliveira

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