30.8.20

A menina dos potes de mel

Ela caminhava como uma estrela sozinha, deixada para trás pelos irmãos mais velhos. O sol era tão forte que, de vez em quando, ela parava um pouco à sombra de uma castanheira para limpar o suor que banhava a pele jovem de menina. 

A doçura daquela missão tinha muito a ver com os potes de mel que vendia. Tudo era produzido pelo pai, ferroviário, no quintal de sua casa. A mãe era tecelã, uma zelosa dona de casa com seus seis filhos. O pai, por força da necessidade, logo se revelou um habilidoso regente de uma orquestra feita de ouro. Passeava entre os caixotes de abelhas como quem protegia crianças num berçário. 

A filha mais nova se esforçava para convencer seus potenciais clientes.

– É ótimo para curar gripe, garganta inflamada, tosse e nariz escorrendo – dizia a garota completamente vermelha da quentura do meio da tarde. Tão pequena ainda, mas tão determinada a se tornar uma vendedora de respeito. Às vezes, botava os potes dourados no chão para conseguir escalar a ladeira.

 Compra, compra de mim um pote de mel. É muito bom para a saúde, curar chieira no peito, fortalecer menino que nasceu franzino e desgrudar pigarro esfolando a goela.

Não havia quem não se comovesse ao ver aquela mocinha frágil, custando a carregar a saborosa mercadoria, arrastando seus chinelos velhinhos sobre a terra grosseira.

 Quando a gente está quase gripando, minha mãe derrete bastante mel no leite quente, mistura umas folhas verdes e dá esse chá pra gente beber.

Animados, os crédulos fregueses perguntavam:

 É mesmo? E vocês melhoram?

E com a transparência de um pequeno anjo esquecido na Terra, ela respondia:

 Ah... nada!

Arrancando risos de todo mundo, diante de tamanha sinceridade, a jovem vendedora ia colecionando sorrisos de estranhos pelo caminho, enquanto via, um a um, os potes de mel desaparecendo da sacola. Ela voltava para casa com os bolsos cheios de dinheiro, na certeza de ter vendido muito mais que a doçura daquele néctar dos deuses, ao distribuir de brinde a leveza e a inocência da infância.

(Esta é uma história verdadeira. Minha mãe é a menina dos potes de mel.)

Pedro Antônio de Oliveira

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